Uso de anestésico local contendo adrenalina ou nor-adrenalina em cardiopatas e hipertensos
Georges Garcia - Cirurgião-Dentista
O Autor fez um estudo bibliográfico sobre o uso de adrenalina e nor-adrenalina, contido nos anestésicos locais, em pacientes com enfermidades cardíacas e hipertensão arterial.
Observou que o uso não é contra-indicado a estes pacientes, desde que se tomem cuidados especiais e não se ultrapassem doses máximas recomendadas.
Uso de Anestésico Local contendo Adrenalina ou Nor-adrenalina em Cardiopatas e Hipertensos
INTRODUÇÃO
O Uso de
vasoconstritores nas soluções anestésicas locais traz grandes vantagens para
obtenção de uma anestesia eficaz. Pela vasoconstrição local provocada, ocorre
um retardamento da absorção do anestésico local injetado, advindo as seguintes
vantagens de sua utilização:
1. Aumento
da duração da anestesia.
2. Aumento
da profundidade da anestesia.
3. Redução
da toxicidade do anestésico local.
4. Utilização
de menores volumes da solução anestésica.
5. Diminuição
do sangramento em procedimentos cirúrgicos.
A adrenalina
(epinefrina) e nor-adrenalina (levoarterenol) são os vasoconstritores mais comumente
utilizados.
A síntese
de adrenalina e nor-adrenalina pelo nosso organismo ocorre na medula da glândula
supra-renal e fibras nervosas simpáticas pós-ganglionares. Estas substâncias
estimulam receptores a localizados nas paredes das arteríolas, provocando
vasoconstrição.
Questionam-se
muito os efeitos sistêmicos do uso dessas drogas nos anestésicos locais em pacientes
com enfermidades cardíacas ou hipertensão arterial.
É objetivo
deste artigo avaliar a possibilidade do uso destas drogas nestes pacientes.
REVISÃO
DA LITERATURA
1.
Quanto aos efeitos da adrenalina e nor-adrenalina.
Inúmeros
autores realizaram estudos sobre os efeitos circulatórios da adrenalina contida
na solução anestésica.
McCarty
(17) quando administrou 1 ml de anestésico com adrenalina em injeção infiltrativa
vestibular superior, não obteve variação da pressão arterial sistólica e do
ritmo cardíaco e observou uma diminuição da pressão diastólica. Quando administrou
uma solução de soro fisiológico no palato, observou aumento da pressão diastólica.
Isso ocorreu devido à liberação de adrenalina endógena, causada pela dor provocada
pela injeção palatina de uma substância não anestésica.
Piperno
e Kaim (20) obtiveram aumento significante da pressão arterial sistólica
quando utilizaram mepivacaína 3% sem adrenalina. Já com a lidocaína 2% associada
à adrenalina, observaram uma diminuição da pressão sistólica.
Cioffi
e cols. (7) observaram um pequeno aumento do ritmo cardíaco e a pressão
arterial se manteve inalterada após o uso da lidocaína com adrenalina
Outros autores,
como Vernal (25), Salman e Schwartz (21), Cheraskin e Prasertsuntarasai
(5) e Wallace e cols. (26) não observaram variações da pressão arterial
e ritmo cardíaco após a administração de anestésico local com adrenalina.
Dick
(9), numa revisão de 30 anos, não encontrou nenhum caso fatal atribuído
ao uso de adrenalina em anestesia odontológica.
Segundo
uma reportagem conjunta da American Heart Association e American Dental
Association (15), os vasoconstritores não são contra-indicados a pacientes
com enfermidade cardíaca diagnosticada e controlada. É recomendado o uso de
sedativos a estes pacientes e promover aspiração da seringa antes da injeção.
2.
Quanto à dose.
As concentrações
geralmente utilizadas de adrenalina são de 1:50.000 ou 1:100.000.
A concentração
de 1:50.000 contém 0,02mg de adrenalina por ml de solução anestésica.
A concentração
de 1:100.000 contém 0,01mg por ml.
Para a nor-adrenalina,
são utilizadas concentrações de 1:30.000 ou 1:50.000.
A quantidade
de nor-adrenalina em uma solução 1:30.000 é de 0,034 mg por ml, e numa solução
1:50.000 é de 0.02mg por ml de solução anestésica.
Complicações
sérias, em pacientes normais, ocorrem em doses acima de 0,5 mg de adrenalina
(50 ml da solução 1:100.000).
Fatalidades
ocorrem com doses acima de 4 mg (400 ml da solução 1:100.000).
Em um relatório
de uma comissão especial da New York Heart Association (24), é recomendado
que em cada sessão não se utilize mais que 0,2 mg de adrenalina nos pacientes
com problemas cardíacos. Essa quantidade está presente em 20 ml da solução de
concentração 1:100.000 e em 10 ml da solução 1:50.000.
Levando-se
em conta que em Odontologia não são necessários mais do que 1ou 2 ml de anestésico
para os procedimentos de rotina, contamos com uma boa margem de segurança.
Bennett
(2) acha um ponto de vista muito liberal da New York Heart Association.
Este autor recomenda a dose máxima para os portadores de enfermidades cardíacas
de 0,04 mg de adrenalina (4 ml da solução 1:100.000) e 0,14 mg de nor-adrenalina
(7 ml da solução 1:50.000). Os hipertensos moderados podem ser tratados como
pacientes normais em todos os aspectos. Já na hipertensão maligna, a dose máxima
de adrenalina deve ser de 0,1 mg (10 ml da solução 1:100.000).
Na prática,
podemos utilizar o anestésico com vasoconstritor abaixo da dose máxima, e se
houver necessidade de maior quantidade de anestésico, continuaremos com o uso
daquele sem adrenalina ou nor-adrenalina.
CONCENTRAÇÕES
IDEAIS DO VASOCONSTRITOR
Ainda hoje,
utilizam-se concentrações excessivas de vasoconstritor nas soluções anestésicas
locais.
Alguns autores
recomendam concentração de adrenalina de 1:100.000.
Bennett
(2) recomenda o uso de concentração de 1:200.000.
Num trabalho
de Keesling e Hinds (14) ficou demonstrado que praticamente não existe
diferença na duração da anestesia entre uma concentração 1:50.000 e 1:250.000.
Gangarosa
e Halik (10) observaram que uso de uma concentração 1:300.000 é tão eficiente
quanto o uso de uma 1:100.000.
Portanto,
uma concentração menor parece ser ideal para o uso nos anestésicos locais em
Odontologia, diminuindo assim a possibilidade de efeitos adversos provocados
pela adrenalina, principalmente em pacientes cardiopatas.
CONTATO
COM O MÉDICO DO PACIENTE
Geralmente
os médicos utilizam maiores concentrações de vasoconstritor e volumes bem maiores
da solução anestésica que os usados em Odontologia.
Por isso
que muitas vezes em contra-indicam o uso de adrenalina em pacientes com distúrbios
cardio-circulatórios, pensando que utilizamos doses semelhantes.
Então, no
nosso contato com o cardiologista do paciente, devemos dizer a ele o tipo, a
concentração e a dose total de vasoconstritor que pretendemos administrar. Devemos
tomar conhecimento profundo do estado do paciente: tipo de patologia cardíaca,
gravidade da doença, tempo da doença, etc.
Vão depender
destes fatores o modo de agir com estes pacientes e a quantidade máxima de vasoconstritor
que poderemos administrar com segurança.
CUIDADOS
COM O CARDIOPATA
Além de
respeitarmos a dose máxima recomendada, temos que observar uma série de cuidados
ao promovermos anestesia nos pacientes portadores de doença cardíaca e hipertensão
arterial:
1.
Procurar utilizar anestésico com menor concentração de adrenalina ou
nor-adrenalina.
2.
Promover sessões curtas evitando provocar stress nestes pacientes.
3.
Utilizar medicação pré-anestésica sedativa. Cheraskin e Prasertsuntrarasai
(4) mostraram que este recurso produz significante diminuição da pressão arterial
em hipertensos submetidos ao tratamento odontológico. Os benzodiazepínicos
(Diazepam) servem perfeitamente para este fim.
4.
Evitar causar dor ao paciente, utilizando anestésico tópico, injeção lenta,
técnica correta, etc.
5.
Utilizar sempre seringas que possibilitem a aspiração pré-injeção. Geralmente
os efeitos indesejáveis ocorrem por uma injeção intravascular acidental. Harris
(12) mostrou que em 3% das injeções o bisel da agulha se encontra
no interior de um vaso. Portanto, a aspiração é indispensável.
6.
Promover uma injeção bem lenta da solução anestésica, podendo parar a manobra
antes da injeção de todo o conteúdo do tubete, caso o paciente mostre sinais
de algum problema. Muitas vezes os efeitos gerais produzidos após a anestesia
são erroneamente atribuídos ao anestésico ou ao vasoconstritor. A dor, ansiedade
e o medo sofridos pelo paciente levam a uma liberação de adrenalina endógena
em quantidade muito maior que a contida em um tubete anestésico. Portanto,
é necessário que tenhamos uma anestesia efetiva suprimindo totalmente a dor
e evitando uma tensão maior no paciente com disfunção cardio-circulatória.
CONCLUSÃO
É possível
e viável o uso de adrenalina ou nor-adrenalina associadas ao anestésico local
em pacientes com enfermidades cardíacas e hipertensão arterial, desde que
se observem certos cuidados e não se ultrapasse a dose máxima recomendada.
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