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Epidemiologia e etiologia do traumatismo dental em dentes permanentes na região de Bragança Paulista
Admilson Carrascoz
Carlos Henrique Ferrari ( ferrari-endousf@uol.com.br ) - Prof. Universitário Jacy Simi Jr.
João Marcelo Ferreira de Medeiros
O objetivo do presente estudo foi investigar a incidência e as causas do traumatismo dental em dentes permanentes na população da região de Bragança Paulista. Foram estudados 189 casos, totalizando 363 injúrias ocorridas em 355 dentes de pacientes atendidos no período de 1996 até 1999, em clínicas particulares de Bragança Paulista e na clínica de Odontologia da Universidade São Francisco. Os resultados permitem-nos traçar um perfil do trauma dental, servindo de subsídio para campanhas de prevenção e planos de atendimento na região de Bragança Paulista, bem como de servir de base para investigações futuras.
Disciplina
de Endodontia, Curso de Odontologia, Centro de Ciências Biológicas e de Saúde,
Universidade São Francisco.
http://www.usf.com.br/endodontia
Sumário:
O
objetivo do presente estudo foi investigar a incidência e as causas do
traumatismo dental em dentes permanentes na população da região de Bragança
Paulista. Foram estudados 189 casos, totalizando 363 injúrias ocorridas em 355
dentes de pacientes atendidos no período de 1996 até 1999, em clínicas
particulares de Bragança Paulista e na clínica de Odontologia da Universidade
São Francisco. Os resultados permitem-nos traçar um perfil do trauma dental,
servindo de subsídio para campanhas de prevenção e planos de atendimento na
região de Bragança Paulista, bem como de servir de base para investigações
futuras.
Introdução
O
traumatismo dental é um problema de saúde pública em nossa sociedade,
atingindo parcelas cada vez maiores da população e causando aos atingidos,
danos estéticos, psicológicos, sociais e terapêuticos1, além de
altos custos expendidos na reabilitação oral, quando ocorrem acidentes de
maior gravidade que causam, mormente, perdas dentais múltiplas. Em países onde
o controle da incidência da cárie se tornou efetivo, o traumatismo dental é o
maior problema de saúde bucal
entre jovens encontrado pelos clínicos2,3,4.
Diversos
estudos no mundo todo apontam para índices que variam de 4 a 30% de incidência
de traumatismos dentais na população em geral1. O maior índice de
traumatismos em dentes permanentes ocorre na adolescência, porém índices
consideráveis são encontrados na literatura em pacientes pré-adolescentes e
na faixa de 20 a 30 anos, além disso, casos são relatados em pacientes de
faixas etárias maiores5,6,7. Os pacientes do sexo masculino ainda são
os mais atingidos, porém a tendência dos últimos anos apontam para um índice
cada vez maior de casos no sexo feminino, devido a maior participação da
mulher em atividades em que há riscos de acidentes. As causas mais comuns de
traumatismo dentário são quedas e pancadas diversas, acidentes na prática de
esporte, brigas e acidentes de trânsito1.
Apesar
da alta incidência de traumatismo dental na população, pouco se faz por parte
dos profissionais e instituições de saúde, para esclarecer à população
sobre como proceder em casos de acidentes traumáticos envolvendo a dentição,
ou mesmo para alertar sobre meios de prevenção do trauma dental, fato que
contribui ainda mais para o aumento dos índices de trauma e faz com que os
danos para o paciente sejam cada vez maiores.
O
objetivo do presente estudo foi de traçar um mapa da incidência e das causas
do traumatismo dental em dentes permanentes, bem como de definir a distribuição
de casos de acordo com o tipo de traumatismo, em pacientes atendidos em consultórios
particulares na região de Bragança Paulista e na clínica odontológica da
Universidade São Francisco. Os resultados poderão indicar as situações e
faixas etárias de risco nessa população, para que campanhas de prevenção e
esclarecimento sejam estimuladas atingindo grupos específicos.
Materiais
e métodos
A coleta de dados foi realizada entre os anos de 1996 e 1999 reunindo-se
casos de traumatismos dentais em dentes permanentes ocorridos em consultórios
particulares e na clínica de Odontologia da Universidade São Francisco. Foram
analisados 363 casos de traumatismo dental, ocorridos em 355 dentes de 186
pacientes, independente de idade e sexo. Os questionários foram preenchidos
baseando-se no exame clínico, radiográfico e na anamnese feitos diretamente
com o paciente ou baseando-se nos dados obtidos pelos clínicos que fizeram o
diagnóstico e o atendimento, e constavam do nome do paciente, idade, sexo,
dentes atingidos, como ocorreu o acidente e o tipo de trauma ocorrido. As causas
foram adaptadas da classificação sugerida por Andreasen em quedas (inclusive
quedas de patins, skate e bicicleta), pancadas, traumas no esporte (incluindo-se
quedas e pancadas durante a prática esportiva), acidentes automobilísticos
(incluindo-se acidentes de motocicleta e atropelamentos), brigas e causas de
origens diversas. A classificação dos tipos de traumatismo utilizada foi
adaptada da preconizada por Andreasen1 para injúrias de dente e
polpa (fraturas de coroa complicada e não complicada, fraturas coroa-raíz
complicada e não complicada e fratura radicular), injúrias ao periodonto
(concussão, subluxação, luxação lateral, extrusão, intrusão e avulsão) e
fratura do processo alveolar. Os
dados foram então computados e os resultados analisados.
Resultados
Dos 189 pacientes estudados, 70,9% pertenciam ao sexo masculino e 29,1%
pertenciam ao sexo feminino. As idades variaram de 6 a 49 anos, e picos de ocorrência
foram encontrados aos 10 anos (21 casos) e aos 20 anos (17 casos). A ocorrência
de casos de acordo com a idade está representada na tabela 1. A ocorrência de
casos de acordo com sexo está representada na figura 1. A incidência de casos
de acordo com sexo e idade está representada na tabela 2 e figura 2.
Idade
|
6-10
|
11-15
|
16-20
|
21-25
|
26-30
|
31-35
|
36-40
|
41-45
|
46-50
|
N0.
%
|
42
(22,2%)
|
54
(28,6%)
|
46
(24,3%)
|
27
(14,2%)
|
11
(5,8%)
|
5
(2,6%)
|
1
(0,52%)
|
2
(1,05%)
|
1
(0,52%)
|
Tabela
1 – Número de casos e porcentagem de ocorrência de acordo com a faixa etária.
Figura
1 – Porcentagem de casos de acordo com o sexo
|
Masculino
|
Feminino
|
Total
|
6-10
anos
|
27
(64,3%)
|
15
(35,7%)
|
42
|
11-15
anos
|
39
(72,2%)
|
15
(27,8%)
|
54
|
16-20
anos
|
40
(87,0%)
|
6
(13%)
|
46
|
21-25
anos
|
22
(81,5%)
|
5
(18,5%)
|
27
|
26-30
anos
|
6
(54,5%)
|
5
(45,5%)
|
11
|
31-35
anos
|
3
(60,0%)
|
2
(40%)
|
5
|
36-40
anos
|
1
(100%)
|
0
|
1
|
41-45
anos
|
1
(50%)
|
1
(50%)
|
2
|
46-50
anos
|
1
(50%)
|
0
|
1
|
Figura
2 – Número e porcentagem de ocorrência de acordo com faixa etária e sexo.
Figura
2 – Porcentagem de casos de acordo com sexo e idade
Dos 363 dentes atingidos, os incisivos centrais superiores foram os mais
atingidos (235), seguidos pelos incisivos laterais superiores (63), incisivos
centrais inferiores (18), caninos superiores (9), incisivos laterais inferiores
(8), pré-molares superiores (7), caninos inferiores (5), molares superiores
(4), molares inferiores (3) e pré-molares inferiores (2). A distribuição de
casos por elemento dental está representada na tabela 3. A figura 3 representa
a porcentagem da ocorrência de casos de acordo com o grupo dental atingido. A
figura 4 representa a distribuição de casos de acordo com a região e arcada
atingida. Dos 198 casos estudados, 100 envolveram apenas um dente, enquanto 52
atingiram 2 dentes e 19 atingiram 3 dentes ou mais (Figura 5).
Dente
|
17
|
16
|
15
|
14
|
13
|
12
|
11
|
21
|
22
|
23
|
24
|
25
|
26
|
27
|
No
|
0
|
2
|
1
|
3
|
4
|
33
|
144
|
91
|
31
|
5
|
2
|
1
|
2
|
0
|
Dente
|
47
|
46
|
45
|
44
|
43
|
42
|
41
|
31
|
32
|
33
|
34
|
35
|
36
|
37
|
No
|
0
|
1
|
1
|
-
|
3
|
5
|
11
|
7
|
3
|
2
|
-
|
1
|
2
|
0
|
Tabela
3 – Distribuição de casos de acordo com o dente atingido
Figura
3 – Porcentagem de ocorrência de acordo com o grupo denta
Figura
4 – Porcentagem de casos de acordo com a arcada e o dente atingido
Figura
5 – Dentes traumatizados por acidente
Os
motivos mais comuns dos traumatismos dentais foram as quedas diversas, seguidos
por pancadas de várias origens, acidentes automobilísticos, traumas na prática
de esporte, brigas e outras não especificadas, variando conforme o sexo do
paciente, de acordo com a tabela 4. Em 19 casos não houve a possibilidade da
elucidação do motivo do acidente. A figura 6 representa os motivos dos
traumatismos em relação ao sexo do paciente.
Causa
|
Quedas
|
Pancadas
|
Acidente
|
Esporte
|
Briga
|
Outras
|
N0.
%
Sexo
|
86
(50,3%)
M
F 54 32
|
26
(15,2%)
M F
18 8
|
23
(13,4%)
M
F
19 2
|
21
(12,2%)
M
F 21 2
|
13
(7,6%)
M
F 13 0
|
2
(1,16%)
M
F 1 1
|
Figura
6 – Porcentagem de casos de acordo com o sexo e causa
De
acordo com o tipo de traumatismo ocorrido, 58, 6% dos casos referiam-se a
fraturas de coroa, sendo que 175 eram do tipo não complicada e 38 do tipo
complicada. As fraturas coroa-raíz representram 1,1% do total de casos, sendo
que 1 era do tipo não complicada e 3, complicada. O número de fraturas
radiculares encontrado foi de 29. As injúrias do periodonto constituíram-se de
32,2% dos casos estudados, assim divididos: concussão, 5 casos; subluxação,
44 casos; luxação lateral, 21 casos; intrusão, 4 casos; extrusão, 11 casos e
avulsão, 27 casos. Foram registrados também 5 casos de fratura alveolar. A
porcentagem de ocorrência de acordo com o tipo de traumatismo está
representada na figura 7.
Figura
7 – Porcentagem de casos de acordo com tipo de trauma
Discussão
O
estudo da distribuição e da etiologia do traumatismo dental constitui fonte
inesgotável de investigações em todo o mundo, devido às diferenças sociais,
econômicas, culturais e geográficas entre nações e até mesmo entre
diferentes regiões de um mesmo país ou estado, que determinam mudanças drásticas
nos tipos de traumas ocorridos, na ocorrência e prevalência de acordo com
idade e sexo, e principalmente nas causas que levam aos acidentes traumáticos.
Segundo diversos autores, outros fatores também influem, como o local de
atendimento8,9, (clínicas costumam
deparar-se com casos de menor gravidade, enquanto os hospitais atendem os
casos mais graves) e até mesmo a época do ano, devido à tendência de maiores
índices no verão e nas férias escolares8,10,11,12. Ademais, com o
passar dos anos, a tendência é de agravamento dos índices de traumatismo1,
devido a aspectos como o aumento da violência, maior participação dos jovens
em esportes de contato e aumento dos índices de acidentes automobilísticos.
Devido
ao exposto, a discussão acerca dos resultados encontrados por nós em comparação
aos trabalhos encontrados na literatura, torna-se muitas vezes dificultosa, uma
vez que o relacionamento entre os fatores em diferentes regiões do mundo é,
amiúde, ineficiente.
A
maior ocorrência de traumatismos no sexo masculino (70,9%) encontrada por nós
é corroborada pela maioria dos trabalhos encontrados na literatura, tanto na
avaliação da incidência5,6,10,13,14, aspecto estudado por nós,
quanto na avaliação da prevelência1,7,15. A tendência porém é
que com o passar dos anos, aumentem as ocorrências no sexo feminino, devido à
maior participação das mulheres na sociedade1,15.
Os índices obtidos por nós com relação à ocorrência de acordo com a
idade dos pacientes encontra relacionamento com os índices de diversos
trabalhos, e ocorre aí uma peculiaridade: em grande parte das pesquisas parece
haver um pico, em ocorrência e prevalência, também registrado por nós, aos
10 anos de idade6,11,15,16. A maior diferença na ocorrência de
traumatismo dental entre os sexos parece ocorrer na adolescência e juventude,
dos 11 aos 25 anos. Em um estudo irlandês5, a ocorrência de
traumatismos em pacientes em idade adulta revela não haver discrepâncias
relevantes entre os sexos, fato também encontrado por nós, que entretanto, não
é confirmado em um estudo realizado na Turquia7.
Em
relação ao número de dentes afetados por acidente, dentes e arcada atingidos,
nossos índices são semelhantes a resultados de estudos realizados em clínicas
e hospitais universitários6,7,11,13,17,18 Porém nossos registros
referem-se não só à atendimentos realizados na Universidade, que claramente
atende casos de maior gravidade, mas também a atendimentos realizados em
consultórios particulares. Portanto, carecem-se de mais estudos de nossa parte,
analisando esse aspecto.
A
etiologia dos acidentes talvez seja a variável mais discrepante encontrada na
literatura, devido a maior influência de inúmeros fatores externos. Nossos
resultados demonstram uma clara diferença entre os sexos de acordo com
determinada causa. Em relação às quedas e pancadas diversas ocorre um equilíbrio,
comparável aos índices em relação ao sexo (70,9% - 29,1%). Porém em relação
aos acidentes na prática de esportes, acidentes automobilísticos e brigas
ocorreu uma predominância do sexo masculino, obviamente devido à maior
participação dos homens nos aspectos citados. Entre os esportes, o futebol é
o responsável pela maior quantidade de casos, visto que é o esporte mais
praticado em nossa região. Oportunamente
devemos lembrar que medidas de prevenção deveriam ser tomadas visando
minimizar as causas dos traumatismos dentais ocasionados na prática esportiva19,20.
Os índices de traumatismos em acidentes automobilísticos também poderia ser
evitado com o uso de cinto de segurança, uma vez que na grande maioria dos
casos de acidentes envolvendo a dentição, os pacientes não fazim seu uso. As
duas ocorrências registradas como outras, referem-se à tentativas de abrir
garrafa de refrigerante com os dentes. Nossos resultados em relação à
etiologia vai ao encontro de outros estudos1,13,21. Em trabalhos com
resultados discrepantes aos nossos, além das diferenças regionais citadas,
ocorrem também diferenças de metodologia10,15 agrupando as causas
em grupos diferentes, o que dificulta qualquer comparação.
A
comparação dos casos de acordo com o tipo de traumatismo é dificultada pelos
diferentes métodos de classificação utilizados, como o da Organização
Mundial de Saúde22, de Garcia-Godoy23 e de Andreasen1,
este último a nosso ver mais completo, e, portanto, utilizado em nosso estudo.
Entretanto, comparando-se os resultados levando-se em conta apenas a classificação
em injúrias aos tecidos duros e ao periodonto, nossos resultados encontram
respaldo em alguns trabalhos encontrados na literatura7,13. Outro
fator, já citado, que dificulta comparações é a diferença nos tipos de
traumatismos encontrados em clínicas e hospitais. As clínicas deparam-se mais
com fraturas dentais, enquanto hospitais tem maior número de lesões ao
periodonto. Os índices encontrados por nós, por ser um estudo misto, possui
aspectos referentes aos dois ambientes1,24, e devem ser desmembrados
em trabalhos futuros, para resultados mais conclusivos.
Por
outro lado, ao nosso ver, alguns índices encontrados por nós não correspondem
à realidade clínica. A concussão obviamente acontece com mais freqüência,
porém a dificuldade do diagnóstico pela sua natureza de associação aos
outros traumas, pricipalmente fraturas de coroa, e a menor gravidade, que não
leva o paciente a procurar ajuda profissional, faz com que os índices
enontrados sejam baixos.
O presente estudo presta-se também para alertar ao clínico
quanto ao correto diagnóstico, atendimento emergencial, e acompanhamento, além
da informação aos pacientes envolvidos em situações de risco acerca da
prevenção dos acidentes, reduzindo-se assim a ocorrência e as seqüelas
inerentes a grande parte dos casos. Alerta-se também para que o profissional
que realizou o atendimento, comunique o caso à Universidade ou instituição de
saúde, para que estudos cada vez mais abrangentes sejam realizados. Os dados
obtidos por nós servem também como base para novos trabalhos, investigando
separadamente cada aspecto estudado no presente estudo.
Conclusão
Baseado nos resultados e na discussão apresentada, podemos concluir o
que segue:
1.
Os indivíduos do sexo masculino sofrem 2,4 vezes mais traumatismos
dentais que os do sexo feminino. A faixa de idade mais atingida situa-se dos 11
aos 15 anos.
2.
De acordo com a classificação etiológica de Andreasen, as causas mais
comuns foram as quedas diversas seguido de pancadas, acidentes automobilísticos,
traumatismos na prática esportiva e brigas. As causas oscilaram de acordo com o
sexo dos pacientes.
3.
Os tipo mais comum de trauma encontrado foi a fratura de coroa não
complicada, seguido de subluxação e fratura de coroa complicada.
4.
Os resultados alertam para que a prevenção seja estimulada, bem como
que o diagnóstico seja realizado com acurácia, e que as Universidades tomem
conhecimento dos casos para que estudos detalhados de etiologia e epidemiologia
do traumatismo dental sejam realizados.
Revisão
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