Aplicação de osseobond e biohapatita em caso de colocação imediata de implante de titânio dentoflex - estudo clínico e histológico
Eulázio Taga
Jorge Mulatinho
No presente artigo apresentamos um caso de implantação de elemento de titânio, realizado imediatamente após a extração dentária. Utilizamos a mistura de Osseobond e Biohapatita para o preenchimento do amplo espaço existente entre o implante e as paredes laterais da loja óssea. A análise radiográfica e macroscópica, testes clínicos e a observação histológica dos cortes de fragmentos coletados na reabertura cirúrgica do local do implante após 6 meses, mostraram que o Osseobond e a Biohapatita são substituídos por tecido ósseo neoformado em fase adiantada de organização. A possível participação desses biomateriais na ósteoindução e ósteo-condução para neoformação óssea é discutida.
INTRODUÇÃO 
 
A
colocação de implante de titânio imediatamente após a extração cirúrgica
de um dente, defronta-se com o problema do leito ósseo receptor ser
sensivelmente maior do que o implante. 
 
Neste
caso, existe uma alternativa para sua viabilidade, que é o da fixação do
implante metálico no fundo do leito ósseo e o preenchimento do amplo espaço
existente entre o elemento metálico e as paredes laterais da cavidade óssea,
com matriz orgânica óssea liofilizada associada ou não a hidroxiapatita
reabsorvível, buscando-se com isto, estimular a formação de novo tecido ósseo,
pelo mecanismo de ósteo-indução. 
 
Este
procedimento baseia-se no fato de que a matriz orgânica óssea contém fatores
locais de diferenciação e crescimento ósseo, as proteínas maorfogenéticas
ósseas, que quando liberadas no sítio da lesão, podem artificialmente induzir
a diferenciação de células osteogênicas no local(URIST8, 1965; URIST et
al.9, 1975; REDDI e ANDERSON5, 1976; GLOWACHI et al.1 1981; MULLIKEN et al.3,
1981; SONIS et al.7, 1983). 
 
No
presente trabalho apresentamos um caso clínico, tratado de maneira acima
descrito, onde após o período pré-protético de consolidação do implante,
foi realizado a coleta, de tecido duro formado junto ao implante para estudo
histológico. Os resultados dessa biópsia também estão relatados neste
artigo. 
 
MATERIAIS
E MÉTODOS 
 
Paciente 
 
Paciente
leucoderma, 42 anos, enviado por outro profissional, com diagnósticos de
fratura radicular no incisivo central esquerdo(Fig.1a),
oque foi comprovado clínica e radiograficamente. A 24 horas antes da cirurgia,
o paciente foi preparado com administração dos medicamentos Flagy 400 mg e
Amoxil 500 mg. 
 
PROCEDIMENTOS
CIRÚRGICOS  
 
Após
os procedimentos de assepsia e de anestesia local, realizou-se a incisão
intrasulcular e a remoção da coroa dentária e da raiz fraturada com auxílio
de elevador Heidbrink reto.  
 
Cautelosa
curetagem do alvéolo, especialmente na sua porção apical, seguida de fresagem
óssea segunado protocolo Dentoflex de
implantes ósseo-integrados, com motor Nouvag 6000 a 1.700 rpm sob intensa
irrigação externa com soro fisiológico (Fig.1b).
 
 
Colocação
de implante Dentoflex 3,75 mm de diâmetro
por 15 mm de comprimento, com ancoragem apical (Fig.1c)
e parafuso de cobertura (Fig.1d).  
 
No
espaço existente entre o implante e a loja óssea (veja as figuras 1c e 1d) foi
colocada Ossebond (matriz óssea bovina autolisada, desmineralizada, submetido a
extração de antígenos e liofilizada) associada a Biohapatita (hidroxiapatita
microgranular reabsorvível) na proporção 1:1, recobrindo inclusive o parafuso
de cobertura (Fig.1e).  
 
A
região foi em seguida recoberta com uma barreira biológica Dentoflex de PTFE (Fig.1f).
 
 
As
suturas foram do tipo interrompida simples e realizada com linha de Nylon 4-0 (Fig.1g).
 
 
A
coroa do dente extraído, sofreu clareamento em líquido de Dakin e foi
aproveitado para confecção de prótese adesiva provisória, que foi preso aos
dentes vizinhos com auxílio de tela metálica recortada, e resina fotopolimerizável,
após ataque ácido das faces palatinas destes dentes
(Figs. 1h e 1i). As suturas foram removidas após 15 dias do ato cirúrgico.
 
 
Seguindo
o protocolo Branemark, aguardamos um período de 6 meses para que ocorresse o
reparo ósseo e a osteointegração, o que foi acompanhado por exame radiográfico
local. 
 
Decorrido
este tempo, realizamos a reabertura cirúgica do local do implante. 
 
Aberto
o retalho e retirada a barreira biológica Dentoflex, foi possível visualizar a
formação de tecido ósseo ao redor do implante e também em cima do parafuso
de cobertura. 
 
Após
a retirada do tecido ósseo que havia se formado sobre este parafuso,
realizou-se os testes clínicos de oste-integração e com auxílio de micro
alveolótomo de Blumenthal, a remoção de fragmentos ósseos na vestibular e
palatina do parafuso de cobertura (Fig.2a). 
 
No
lugar do parafuso de cobertura foi colocado munhão com ombro e perfil de emergência
(serve como cicatrizador da mucosa e para fixação de coroa provisória) e a
mucosa suturada (Figs.2b e 2c). 
 
Uma
coroa imediata foi confeccionada e colocada para ser utilizada durante 60 dias (Figs.2d,
2e e 2f). 
 
Após
este período e constatado que o paciente sentia total conforto na mastigação
e que os tecidos moles peri-implantares exibiam aspectos clínicos normais,
procedeu-se a confecção e colocação de coroa metalo-cerâmica permanente. 
 
PROCEDIMENTOS
HISTOLÓGICOS 
 
Os
fragmentos ósseos removidos da parte superior, vestibular e palatina do
parafuso de cobertura foram fixados em solução de formol a 10% em tampão
fosfato pH 7.2, por um períodode 2 semanas. 
 
À
seguir, os fragmentos foram descalcificados em solução aquosa de EDTA a 5,5%,
durante 20 dias, trocando a solução descalcificante a cada 5 dias. 
 
Após
serem lavados em água corrente por 24 horas, os fragmentos foram desidratados
em etanol (70% a 100%), diafanizados em xilol e incluídos em parafina. 
 
Cortes
com 6um de espessura foram obtidos em
micrótomo Leica-Jung utilizando-se navalhas descartáveis e corados pela técnica
da hematoxilina-eosina e do tricrômico de Masson. 
 
Os
cortes foram examinados e fotografados em fotomicroscópico Zeiss com e sem
filtros de polarização. 
 
RESULTADOS
HISTOLÓGICOS 
 
A
análise dos cortes histológicos mostrou que os fragmentos colhidos estavam
constituídos predominantemente por tecido ósseo, ainda com arranjo em trabéculas
de espessura variável, exibindo entremeadas às mesmas, tecido conjuntivo
ricamente celularizado (Figs. 3a a 3f). 
 
No
tecido conjuntivo inter-trabecular foi possível ainda encontrar com
dificuldade, devido a sua baixa frequência, pedaços de matriz óssea
liofilizada, em estado bem avançado de reabsorção(veja
cabeças de setas na Fig. 3a). Em detalhe na Figura
3b, verificamos que associados a estes pedaços de matriz existem
muitos fibroblastos, alguns deles parecendo terem penetrado no seu interior
através de pequenos canais escavados à partir da superfície. 
 
As
trabéculas mais espessas já tendem a exibir aspecto morfológico de tecido ósseo
compacto, com aumento na quantidade de tecido ósseo e diminuição nos espaços
conjuntivos, que assumem a morfologia de canais nutritivos (Figs. 3a
e 3e). 
 
A
observação destas trabéculas no microscópico com filtros de polarização,
mostrou que a grande maioria delas, exibe arranjo lamelar, como o visualizado
nas Figuras 3d e 3f.
Na mesma Figura 3d, observamos uma
pequena trabécula óssea assinalada por seta, onde não ocorre este arranjo
lamelar. 
 
A
análise mais detalhada das Figuras 3c e 3f,
mostrou na primeira, a presença na trabécula do lado esquerdo, de uma nítida
linha cimentante mais corada (seta na Figura 3c)
e na segunda, que os grupos de lamela exibem arranjo descontínuo ou seja, as
lamelas não envolvem tôda a circunferência do canal nutritivo, sendo
continuadas por lamelas de outros grupos. 
 
FOTOS 
 
Figura 1a 
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Figura 1b 
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Figura 1c
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Figura 1d 
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Figura 1e
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Figura 1f 
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Figura 1g
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Figura 1h
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Figura 1I 
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Figura 2a 
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Figura 2b 
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Figura 2c 
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Figura 2d 
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Figura 2e 
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Figura 2f 
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Figura 3a 
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Figura 3b 
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Figura 3c
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Figura 3d 
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Figura 3e 
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Figura 3f   
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DISCUSSÃO 
 
A análise
radiográfica e visual, testes clínicos e a observação histológica dos
fragmentos colhidos na reabertura cirúrgica do local do implante, mostraram que
no local do espaço pré-existente entre o implante metálico e as paredes de
loja óssea, que havia sido preenchida por matriz orgânica óssea liofilizada
associada a hidroxiapatita reabsorvível, existia agora, depois de 6 meses,
tecido ósseo neoformado em fase adiantada de organização, mesmo na porção
superior do parafuso de cobertura. 
 
A neoformação
óssea, após um procedimento cirúrgico no esqueleto, depende basicamente de
dois mecanismos: proliferação de células osteoprogenitoras no osso lesionado
e a migração das células mesenquimais indiferenciadas presentes na zona da
lesão, que se diferenciam em células osteogênicas sob um estimulo indutivo
adequado. O primeiro mecanismo é designado de osteocondução e o segundo de
osteoindução. 
 
Desde o trabalho
pioneiro de URIST8 em 1965, sabe-se que a matriz óssea desmineralizada contém
fatores indutores do crescimento ósseo, designados posteriormente, de proteínas
morfogenéticas ósseas (ou "BMPs"). De tal maneira, que
experimentalmente a matriz óssea alogênica desmineralizada e submetida a extração
de lipídeos, tem capacidade osteoindutora em sítio ectópico (URIST et al.9,
1965) e ortotópico (MULLIKEN e GLOWACKI3,1980) no rato. 
 
Estes achados
fizeram com que se iniciasse a utilização de matriz ósse liofilizada humana,
parcialmente desproteinada para tratamento de lesões ósseas permanentes (para
maiores detalhes consultar a revisão de MULLIKEN et al.4, 1987). Neste sentido,
salientamos que SONIS et al.7(1983) aplicou esta matriz na forma particulada no
tratamento de 21 pacientes com defeitos ósseos periodontais permanentes obtendo
uma significante redução nas lesões após 4 a 18 meses do procedimento cirúrgico. 
 
No presente
trabalho, utilizou-se de matriz orgânica óssea liofilizada de origem bovina
(Osseobond), associada a hidroxiapatita reabsorvível (Biohapatoita), na
expectativa de promover a neoformação óssea por osteo-indução e osteo-condução.É
sabido que a matriz óssea bovina contém as BMPs e que quando isoladas
bioquimicamente na forma purificada tem a capacidade de induzir a formação de
tecido ósseo em sítio ectópico ou ortópico em várias espécies de animais,
desde que se ultilize de uma substância carreadora coveniente, ou seja, as BMPs
não são espécie-específicas (RIPAMONTI e REDDI6,1994). Assim sabe-se, por
exemplo, que a BMP-2 e a BMP-3, exibem homologia na sua estrutura molecular primária
entre o homem e o boi (WOZNEY et al.10, 1988; LUYTEN et al.2, 1989). Por outro
lado, parece que tanto a matriz óssea liofilizada, como a hidroxiapatita,
experimentalmente exibem atividade osteocondutiva. 
 
Nossas observações
mostraram que no transcorrer do período de 6 meses após a colocação da
matriz orgânica bovina autolisada, parcialmente desproteinada e submetido a
retirada de lipídeos associada a hidroxiapatita reabsorvível, ocorreu a
retirada total de hidroxiapatita e de quase toda matriz liofilizada, e a sua
substituição por tecido ósseo vital. A reabsorção da matriz liofilizada sem
a sua incorporação ao tecido ósseo neoformado sugere que neste processo
talvez tenha ocorrido a atividade osteoindutora. No entanto, não devemos
descartar a possibilidade de nos períodos iniciais do reparo, a matriz óssea e
a hidroxiapatita terem atuadas na neoformação óssea pelo mecanismo da
osteocondução. 
 
A predominância
de tecido ósseo lamelar ou secundário em relação ao tecido ósseo não
lamelar ou primário nos mostrou que no período de 6 meses após a cirurgia
ocorreu a substituição da quase totalidade do tecido ósseo primário que se
formou inicialmente na zona do reparo, por tecido ósseo altamente organizado, o
tecido ósseo secundário ou lamelar. Mas o fato das lamelas ósseas exibirem
ainda um arranjo descontínuo e a frequente presença de linha cimentada nas
trabéculas ósseas, nos sugeriu que o tecido ósseo secundário formado
encontrava-se ainda, em processo ativo de remodelação. 
 
Embora o paciente
tenha ficado satisfeito com a estética devido ao fato da sua linha de sorriso
ser baixa, à luz dos conhecimentos atuais lembramos que: os implantes
imediatos, via regra, trazem complicações estéticas difíceis de resolução
cirúrgica ou protética, pelo fato da remoção da barreira biológica provocar
uma contração excessiva dos tecidos moles. 
 
Passamos a ter
resultados melhores preenchendo toda a loja óssea com Osseobond e Biohapatita,
e recobrindo-a com uma membrana biológica reabsorvível; procedendo a colocação
do implante de titânio 6 meses após, quando já ocorreu a neoformação e a
estruturação óssea. 
 
 
 
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS  
 
GLOWACKI
J., KABAN L.B., MURRAY J.E., FOLKMAN J. and MULLIKEN J.B. Aplication of the
biological principles of induced osteogenesis for craniofacial
defects.Lancet,v.1,p.959-983,1981.  
 
LUYTEN
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and partial amino acid sequence of osteogenin, a protein initiating bone
differentiation.J.Biol.Chem.,v.246,p.13377-13380,1989.  
 
MULLIKEN
J.B., GLOWACKI J.: Induced osteogenisis for repair and construction in the
craniofacial region. Plast.Recontr.Surg.,v.65,p.533-559,1980.  
 
MULLIKEN
J.B., GLOWACKI J., KABAN L.B., FOLKMAN J. and MURRAY J.E.: Use of desmineralized
allogeneic bone implants for the correction of maxillocranio-facial
deformities.Ann.Surg.,v.194,p.366-373,1981.  
 
REDDI
A.H. and ANDERSON W.A. Collagenous bone matrix-induced endochondral ossification
and hemopoiesis.J.Cell.Biol.,v.69,p.557-572, 1976.  
 
RIPAMONT
V. and REDDI A.H. Periodontal regeneration: potential role of bone morphogenetic
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SONIS
S.T.,KABAN L.B. and GLOWACKI J. Clinical trial of demineralized bone powder in
the treatment of periodontal defects. J.Oral Med.,v.38,p.117-122, 1983.  
 
URIST
M.R.:Bone formation by autocondution.Sicience,v.159,p.893-899,1965.  
 
URIST
M.R; MIKULSKI A. and BOYD S.D. A chemosterilized antigen-extracted autodigested
alloimplant for bone banks.Arch.Surg.,v.110,p.416-428,1975.  
 
WOZNEY
J.M.,ROSEN V.,CELESTE A.J.,MITSOCK M.,WHITTERS M.J.,KRIZ W.R.,HEWICK R.M. and
WANG E.A. Novel regulators of bone formation: molecular clones and actives
Science,v.242,p.1528-1534,1988. 
  
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