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Ortodontia ou ortopedia funcional dos maxilares?
Joel C. R. Martins - Professor Adjunto e Chefe do Departamento de Clínica Infantil da Fac. de Odontologia de Araraquara/UNESPLidia Parsekian Martins - Aluna do Curso de Pós-Graduação
- Nível de Doutorado em Ortodontia da Fac. Odontologia de Araraquara/UNESP Mauricio T. Sakima - Professor Assistente do Departamento de Clínica Infantil da Fac. Odontologia de Araraquara/UNESP O artigo discorre sobre o debate Ortodontia vs. Técnicas Ortopédicas Funcional dos Maxilares (TOF) no tratamento das más oclusões. Os objetivos da presente publicação incluem a tentativa de esclarecer as origens históricas do debate e, o confronto entre as principais argumentações envolvidas nos dois lados da questão. Os fatores que podem explicar a manutenção do debate, ao longo de quase um século e, as vantagens em se uti-lizar o enfoque moderno que combina o que há de melhor em ambas as filosofias, é destacado, como uma atitude que se consolida como a tendência contemporânea.
Ortodontia ou Ortopedia Funcional dos Maxilares?
INTRODUÇÃO
A
Ortodontia é uma especialidade formalmente reconhecida como aquela que estuda,
diagnostica e trata as más oclusões dentárias. Uma má-oclusão pode ser
caracterizada por desvios do alinhamento dentário, na relação entre os arcos
dentários ou, ainda, envolver os ossos basais maxilares e, assim, pode envolver
diferentes tipos de aparelhos para tratamento. Existem pesquisadores ou clínicos
que dizem ainda, que uma má-oclusão pode ser também muscular. Quando o
procedimento de tratamento visa corrigir as desarmonias ósseas, além do
alinhamento dentário, diz-se que o tratamento não é só ortodôntico, mas
também ortopédico.
A técnica
de tratamento ortodôntico com aparelhos fixos, que é uma parte integrante e
obrigatória da grade curricular de qualquer curso formalmente estabelecido, de
tão importante que é, não raro, se confunde com o nome da própria
especialidade. Assim, um Ortodontista pode ser estereotipado como aquele
especialista que utiliza aparelhos fixos para tratar as más oclusões.
Entretanto, isto é uma simplificação inadequada. Numa discussão, é freqüente
ouvir-se o argumento de que, enquanto a Ortodontia concentra o seu esforço
maior em alta tecnologia de fios e braquetes, para movimentar eficientemente os
dentes, proporcionando alinhamentos de oclusão muito próximo de um obra de
arte, a Técnica Ortopédica Funcional dos Maxilares (TOF) se propõe a buscar
uma forma de influenciar no sistema estomatognático, com aparelhos
relativamente simples de construir, onde o movimento dentário não é a
prioridade, mas sim o restabelecimento do desvio funcional.
Nas
TOF, as influências negativas do ambiente funcional, responsabilizadas como
causas da má-oclusão, devem ser desativadas pelo aparelho e canalizadas, em
direção à normalização do sistema, com o argumento de que essas forças
naturais são mutio semelhantes às forças biológicas e, que por isso promoverão
mudanças morfológicas estáveis.
Poder-se-ia dizer de
uma forma didática que a Ortopedia acredita mais nas forças naturais,
liberadas pelo sistema sob à ação do aparelho, do que nas forças ativamente
produzidas pelos aparelhos. Confrontos de argumentos como: "forças ativas
vs. forças passivas" ou o "mecânico vs. Biológico"
surgem neste debate, que dura já quase um século de bate boca.
O
DEBATE HISTÓRICO: ORTODONTIA vs. ORTOPEDIA
Tradicionalmente,
existem lugares onde o debate é muito acirrado, colocando em discussão, se bem
entendido, mais a preferência dos profissionais por uma ou outra das técnicas,
do que a própria fundamentação científica.
Este
debate ficou muito evidente após a segunda grande guerra, quando os dentistas
Europeus, diante de uma situação de carência de recursos financeiros,
concentraram seus esforços nas Técnicas Ortopédicas Funcionais (TOF) para, de
uma forma socializada, promover o atendimento à enorme demanda por serviços de
correção das más oclusões. Nesta época, a Ortodontia como especialidade,
era inacessível a maioria dos profissionais de países em desenvolvimento, seja
pela alta tecnologia ou, pelo alto nível de treinamento profissional, exigido
para formar o Ortodontista. Como não era possível treinar profissionais em
Ortodontia, em número suficiente para atender todas as crianças com os
sofisticados aparelhos ortodônticos fixos e, como o estado estava exigindo esse
atendimento, treinou-se profissionais em aparelhos removíveis, como uma
alternativa de nítida vantagem econômica.
Muitos notáveis Ortopedistas Funcionais se formaram ao redor do mundo
logo após a segunda grande guerra e, alguns deles, dedicaram-se a estudar os
efeitos dos aparelhos funcionais sobre o crescimento craniofacial. Muitas
observações clínicas se juntaram às boas pesquisas em animais de laboratório,
reforçando os argumentos das TOF para o debate que se estabeleceu ao longo dos
anos. Passada a guerra e os problemas dela decorrente, o debate ganhou a ordem
do dia, porque a Ortopedia Funcional, depois de alguns anos, adquiriu um corpo
doutrinário consolidando-se como disciplina nos cursos Europeus. Ela
oferecia uma alternativa, principalmente, para aqueles que não
conseguiam o acesso ao treinamento formal da Ortodontia, ministrada na maioria
das Universidades americanas, que tinham currículos
mais voltados à biomecânica dos aparelhos fixos, por uma influências de seus
grandes mestres como Angle, Tweed, Brodie etc...
Não
se pode deixar de considerar que, paralelamente ao reconhecido fator econômico
já referido uma discussão sobre a natureza das forças ortodônticas foi
decisivo, marcando o debate "Ortodontia vs. Ortopedia Funcional", que
mais parecia uma batalha "Estados Unidos vs. Europa". A literatura
mostra que, no início do século, os aparelhos fixos liberavam forças
excessivas, promovendo reabsorções radiculares inaceitáveis, o que dava aos
europeus subsídios para uma postura mais biológica. Tanto este argumento era
forte que induziu um aprimoramento dos aparelhos fixos ao longo do tempo sendo,
modernamente, produtores de forças mais leves.
Outro
fator acirrador do debate foi a questão das extrações de pré-molares no
tratamento ortodôntico. Cientificamente consubstanciadas nas análises cefalométricas,
elas se tornaram freqüentes entre Ortodontistas, principalmente naqueles casos
em que o paciente exibia bi-protrusão maxilar e/ou excesso de volume dentário
para o continente de base óssea maxilar. Os Ortopedistas seguraram o argumento
de que o outro lado era muito extracionista, embora sempre soubesse, que entre
os Ortodontistas "extrair ou não extrair", era um outro debate que
hoje sabemos ser tão antigo como o que ora se está comentando.
De qualquer forma, Ortodontistas e Ortopedistas da classe dos fanáticos
brigam muito, ainda hoje, para convencer os pacientes e, sobretudo os
indicadores de pacientes (clínicos gerais), por interesses óbvios de sobrevivência
e de domínio do campo profissional. Os clínicos mais espertos, quando
assediados, pedem para ver os bons resultados em mesas clínicas, a comprovação
estatística nas pesquisas e, às
vezes, até checam a formação daquele que tem o objetivo de convencê-los.
Aqueles clínicos mais cordatos e, às vezes, menos esclarecidos, ouvem e são
realmente convencidos, tornando-se em certas situações, verdadeiros cabos
eleitorais de um ou, outro lado. O
paciente, leigo, vai desde a posição do confusão total, até a de ilusão
absoluta, fascinando-se pela eloquência dos profetas de uma, ou outra seita.
"Qualquer destes profetas, depois de dez anos repetindo a mesma história,
vira um respeitável orador com força nos argumentos, sedimentados ao longo dos
anos, realmente rebuscados e convincentes".
COMEÇANDO
A ESCLARECER
De
uma maneira simplística, pode-se explicar que a Ortodontia se concentra na
utilização de aparelhos ativos, que aplicam forças externas para movimentar
os dentes ou, alterar a forma dos ossos maxilares. Por seu lado, a Ortopedia
Funcional procura alterar a tonicidade ou o local das inserções musculares
associadas à arcada dentária, freqüentemente alterando a posição do osso
mandibular, da língua e, da musculatura peribucal, baseado na hipótese de que
os dentes desalinham-se ou, os
ossos deformam-se, porque os músculos da mastigação, da fonação, da postura
e até da respiração, não estão funcionando corretamente. A busca por estímulos
neuromusculares adequados é o desafia do Ortopedista.
O
Ortodontista nessa linha de debate, de um modo geral, esmera-se em movimentar os
dentes e remodelar o osso alveolar, acreditando que se corrigidas as posições
dos dentes e o relacionamento entre os arcos, as funções estariam beneficiadas
como conseqüência. Se o paciente está crescendo com a função normalizada,
admite-se que a estabilidade do sistema será consolidada. Mesmo quando é
necessário alterações ortopédicas, nos casos das displasias esqueléticas, o
enfoque tem sido, preferencialmente, mais agressivo ou, mais ativo, com forças
de alta magnitude (300 gramas a 1 quilo).
O
Ortopedista Funcional, volta ao argumento de que a Ortodontia corrige as conseqüências,
mas não se importa com as causas do problema e, o debate vai por aí a fora,
pegando fogo. Na filosofia das TOF de tratamento, as forças deveriam ser sempre
passivas e de tão pequena intensidade que se dizem fisiológicas, funcionais ou
ainda naturais, isto é, geradas pelo próprio sistema.
Quem está com a razão o Ortodontista ou o Ortopedista? Os dois é óbvio,
se eles forem ponderados. Ou mesmo, nenhum, se forem extremistas, tendenciosos
ou interessados em fazer seu ponto
de vista prevalecer, sem o suficiente conhecimento clínico, nem mesmo o
conhecimento da literatura
especializada sobre ambas as técnicas.
A
Ortodontia parece ser mais susceptível de ser exercida com má qualidade, em
função da diversidade tecnológica encorporada no tratamento e, por isso tem
sido apontada como de alto potencial iatrogênico. Os ortopedistas, de uma forma
astuta, não deixam de utilizar este argumento nas suas colocações. Este
argumento contrabalança com as grandes limitações de movimentação dentária
dos dispositivos utilizados pela Ortopedia Funcional, também denunciadas freqüentemente
pelos Ortodontistas nos debates. O que se percebe interessante, é que,
argumentos tão pesados e opostos sejam colocados contra uma ou outra técnica,
cujos resultados clínicos são tão bons freqüentemente usados, como uma prova
de que a técnica funciona bem.
Ambos complementam, dizendo: quando você escolheu a correta e, a utiliza com
competência, é claro.
Esse
debate, encontra um paralelo na medicina, que mostra uma grande controvérsia
entre os médicos; o debate homeopatia e alopatia pode ser aqui destacado.
Alguns médicos, acreditam que existe uma forma de utilizar as forças naturais
para corrigir alguns dos próprios erros da natureza, os quais se manifestam nas
doenças e aberrações que acometem os seres humanos. Da mesma forma indicam o
tratamento básico, como a forma de tratar o todo (tratamento de base) e não só
a parte afetada do organismo. Outros médicos acreditam que estas doenças devem
ser tratadas com medicamentos procedimentos ou atitudes práticas, mais
agressivas ou intervencionistas, as quais se mostraram eficazes através dos
tempos com experimentos científicos, clínicos ou laboratoriais, sempre
documentados na literatura.
O
EXTRABUCAL vs. ATIVADOR
O exercício para entender fácil
e adequadamente o debate Ortodontia vs. Ortopedia, da forma como ele se
apresenta hoje, talvez passe pela análise da geometria da má-oclusão de
Classe II, que é a displasia esquelética mais comum. Aceitando-se que essa má-oclusão
seja uma protrusão da base maxilar, é lógico pensar-se em influenciar o arco
superior durante o crescimento para a harmonização da sua relação com a mandíbula.
Esta premissa leva os Ortodontistas a utilizarem o aparelho Extrabucal para
inibir ou controlar o crescimento e/ou os dentes do arco maxilar superior. Por
outro lado, considerando-se que a Classe II se define mais freqüentemente por
uma inadequada posição ou tamanho mandibular, torna-se muito lógico a indicação
de aparelhos ortopédicos para estimular o crescimento ou reposicionar o osso
mandibular, ao invés de influenciar o maxilar superior.
O
bom entendimento do debate pode passar também, por uma consideração biológica
ou mesmo histórica, que apresenta a maxila com maior susceptibilidade de ser
influenciada por forças mecânicas advindas de um aparelho ortodôntico ou
ortopédico. A mandíbula tem sido considerada mais resistente às influenciais
mecânicas porque seu principal centro de crescimento é a cartilagem do côndilo.
Estes dogmas estabelecidos pelos estudos tradicionais de crescimento facial
reforçam o argumento da utilização dos aparelhos Extrabucais.
Por
outro lado, o argumento do controle mecânico do crescimento mandibular começa
a ser muito aceito, em diversos centros de pesquisas, onde experimentos com
animais de laboratório provam esta possibilidade. Nos dias atuais, fala-se
inclusive que ocorreui a substituição do paradigma Genômico pelo paradigma
Morfofuncional em ortodontia (Carlson2 ). Este novo paradigma indica
que influências ambientais têm grande participação na definição da forma
dos osso faciais e também pelos desvios da oclusão. Por exemplo: a cartilagem
do côndilo, vista antes como centro de crescimento autônomo, por ser uma área
de ossificação endocondral, passou a ser muito aceita, atualmente, como um sítio
de crescimento porque, como uma cartilagem secundária, coberta por tecido
conjuntivo fibroso, cresce adaptando-se
às demandas funcionais. Assim, contemplamos um momento, caracterizado por
grande aceitação da teoria da Matriz Funcional para explicar o crescimento
facial e, isto reforça as bases para a indicação dos aparelhos funcionais.
Outro aspecto da geometria da Classe II, que explica a permanência do
debate ao longo dos a anos, é a
aceitação de que desarmonias na dimensão vertical podem ter grande
responsabilidade na definição da Classe II. Admite-se melhor esta idéia hoje
do que no passado. Nesta linha de pensamento, muitos dos aparelhos ortopédicos
baseiam-se no controle da erupção dentária no tratamento da Classe II. Poderíamos
argumentar que muitos Ortodontistas compartilham desta crença também. Da mesma
forma, mais recentemente, o controle da dimensão transversal passou a ser
aceito como fundamental no tratamento da maioria das más oclusões de Classe
II. Isto vai de encontro ao fato de que muitos dos aparelhos funcionais fazem da
expansão maxilar seu ponto básico de tratamento. Nesta mesma linha de
pensamento muitos ortodontistas fazem as disjunções palatinas logo no início
do tratamento da Classe II ou expandem os aparelhos Extrabuacais durante a correção
ântero-posterior.
Dois
exemplos poderão esclarecer a natureza acirrada do debate: Berg1 ao
comentar as vantagens e desvantagem dos tratamentos com aparelhos extrabucais e
aparelhos funcionais, num congresso internacional na Holanda, em 1987, relatou
que utilizava aparelhos funcionais em 25% dos seus casos, logo no começo da sua
vida profissional e, que os reduziu para 5% ao longo dos anos, substituindo-os
por aparelhos extrabucais. O autor destacou ainda 9 vantagens do aparelho fixo,
sobre o funcional. Entre estas vantagens, incluem-se:
1) o extrabucal não interfere com a posição condilar, o que poderia
determinar a possibilidade de mordida dupla por acomodação;
2) o extrabucal comprovadamente retarda o crescimento maxilar, enquanto não
está provado ainda que o aparelho funcional estimula o crescimento mandibular;
3) o extrabucal não inclina os incisivos inferiores para vestibular como os
aparelhos funcionais; 4) o ganho de espaço para alinhamento dos dentes na
maxila é mais eficiente com o aparelho extrabucal.
Por
outro lado, bem mais recentemente, um Ortodontista americano Dr. Iain Edwards, 4
escreveu no fórum de leitores do Am. J.
Orthod. (agosto de 1996) que, após 30 anos de tratamentos com aparelhos
fixos, teria mudado sua forma de trabalho na última década, utilizando mais
freqüentemente os aparelhos funcionais no tratamento da Classe II. Para ele, os
resultados são infinitamente melhores, mais fáceis de se atingir com menor
quantidade de extrações, com melhor estética facial e, menor quantidade de
reabsorções radiculares.
Como
se percebe, não é difícil encontrar-se convincentes argumentos, com base em
opiniões e experiências pessoais de respeitáveis clínicos, quando a intenção
é defender uma determinada (e própria) posição. Difícil é a comprovação
científica de que uma técnica seja, realmente, e de um modo sistemático,
melhor do que a outra em casos semelhantes.
PORQUE
NÃO ORTODONTIA E ORTOPEDIA JUNTOS?
Os
desalinhamentos dentários são melhores e mais rapidamente corrigidos com
aparelhos fixos e, isto já está suficientemente aceito entre os diferentes clínicos
ou pesquisadores. A comprovação disto é que na maioria dos cursos que formam
os Ortodontistas Europeus, alguma técnica de aparelho fixo é parte integrante
da grade curricular.
As
anormalidades das bases ósseas, sejam na forma dos arcos ou na relação entre
os maxilares são corrigidas hoje, freqüentemente, com aparelhos ortopédicos
funcionais e, uma prova disto é que na maioria dos cursos que formam os
Ortodontistas Americanos, alguma técnica de aparelho ortopédico funcional
integra a grade curricular.
Ao
escrever sobre o binômio Ortodontia/Ortopedia, um dos mais notáveis
Ortopedistas Funcionais, o alemão Rolf Frankel5, destacou que o
conceito de Ortopedia suportava fortemente a racionalidade do tratamento
precoce, contrastando com o tratamento ortodôntico em época tardia, que
envolve movimentação dento-alveolar para camuflar a má-oclusão.O autor
destacou que, o enfoque ortopédico, tem que se envolver essencialmente com o
reconhecimento imediato das condições não fisiológicas que influenciam
negativamente o crescimento craniofacial.
Acontece que o tratamento precoce das más oclusões
não era realizado com muita freqüência pelo Ortodontista no passado.
Hoje, é muito comum encontrar o Ortodontista utilizando os próprios
dispositivos do seu arsenal ortodôntico fixo (Disjuntor palatino, extrabucal
placa lábio-ativa etc...) ou, então,
envolver-se com aparatologia ortopédica funcional, para tratar mais cedo as más
oclusões. Atualmente, esta é a primeira fase de um tratamento ortodôntico
dito bi-fásico: na primeira fase, cuida-se da função e do relacionamento
esquelético e, na segunda fase cuida-se do alinhamento dentário. Em
contra-partida muitos ortopedistas, por seus turnos, se utilizam dos aparelhos
fixos somente para desenvolver a sua segunda fase de tratamento, que vem a ser o
alinhamento e nivelamento dentário (Finalização). Deve ser destacado porém
que o tratamento bi-fásico, ele mesmo, pelo seu largo espectro de vantagens e
desvantagens, tornou-se um outro grande debate na Ortodontia contemporânea.
Destes
parágrafos anteriores surge a pergunta: Porque não utilizar as duas técnicas
de forma integrada? Bem, um profissional que utiliza uma só técnica durante
toda a sua vida, poderá ganhar mais experiência e, acabar conhecendo melhor
todas as limitações do seu único tipo tratamento. Esta pode ser uma grande
vantagem, entretanto, manejando a sua técnica no máximo da sua esperteza,
ainda assim, é natural que produza alguns tratamentos com resultados limitados.
A grande variabilidade das más oclusões, que é uma marcante características
do ser humano, não pode ser abstraída. Não há lógica em tentar tratar os
diferentes pacientes com uma mesma técnica. Parece mais inteligente que o
profissional se habilite em várias técnicas e, desta forma, selecione dentre
as diferentes técnicas, aquela mais adequada ao paciente que passa a ser
considerado individualmente e, aceito como único. Até 1966, a publicação que
mais havia contribuído para o entendimento deste velho debate e destacava uso
associado dos aparelhos ortodônticos e ortopédicos era o livro do Graber &
Neumann: Removable Orthodontic Appliances.
7
Uma
revisão rápida na literatura mostra, que num certo momento, muitos
Ortodontistas, concomitantemente ao aparelho fixo, se utilizavam de aparelhos
ortopédicos, denominados ativadores, para reposicionar o osso mandibular. Este
procedimento substituiu, nos casos de retrusão mandibular, o aparelho
extrabucal que era utilizado no controle do crescimento maxilar. Por outro lado,
a literatura mostrou também, que muitos Ortopedistas se utilizavam de aparelhos
fixos para alinhar os dentes, antes ou durante ou após a terapia funcional.
Como ilustração, mostramos um caso clínico, Figuras 1, 2, 3 e 4, utilizando a
técnica combinada de aparelho fixo (Straight Wire de Rooth) e, Ortopédico
Funcional (Bionator de Balters) com um bom resultado final.
Para
ilustrar com dados da literatura, passamos a transcrever dois trechos de dois
dos mais recentes livros texto. Os ortopedistas Witzig & Spahl11
destacam sobre esse assunto: "O uso combinado da Técnica Ortopédica e da
técnica dos Aparelhos Fixos, permite ao moderno clínico obter resultados de
alta qualidade não somente para a oclusão, mas também para a face e a
articulação têmporo-mandibular". Da mesma forma,
um dos mais famosos ortodontistas, GRABER8, em sua recente
obra (Orthodontics: Current Principles and Techniques-1994) "destaca-nos
a conclusão óbvia de que "a combinação de aparelhos fixos com aparelhos
funcionais, podem produzir o melhor possível do mundo ortodôntico, tirando de
cada um, o que eles oferecem de melhor."
Mais
recentemente, aparelhos híbridos (figura 5 e 6), têm sido utilizados com as
vantagens de ambas as técnicas utilizadas isoladamente (Cura et al 3
; Stöckli & Teuscher10 e Henriques9).
Aparelhos funcionais, como o Bionator ou o ativador, incluem tubos para
encaixe do aparelho extrabucal, de forma que o reposicionamento anterior
mandibular pode ser estimulado, enquanto a força extrabucal se encarrega de
controlar o crescimento maxilar. Estes aparelhos se mostram muito ecléticos,
com diversos desenhos, mostrando muita criatividade de ambos os lados, o que
caracteriza um certo ponto de acordo entre Ortodontistas e Ortopedistas
Funcionais contemporâneos, depois de se debateram ao longo de quase um século
para defender as suas técnicas isoladamente. Restam, reticentes,
os profissionais com formação mais ortodoxa ou comprometidos de tal
forma, com o debate, que dificilmente darão o braço a torcer.
COMENTÁRIO
FINAL
Em
qualquer direção que o debate foi no passado ou esteja indo, no presente,
nunca deixou de ficar evidente que o exercício criterioso do diagnóstico e
plano de tratamento é tão ou mais importante que o próprio tratamento das más
oclusões. Da mesma forma, a manipulação dos aparelhos no sistema biológico,
sejam fixos ou removíveis, exigem um treinamento formal que deve ser, de um
modo geral, dois anos, em dedicação integral, numa instituição de
reconhecido rigor educacional, clínico e científico. Assim, aceita-se uma técnica
ortodôntica e/ou ortopédica, desde que bem indicada e bem executada, com o máximo
bom senso.
De
qualquer forma, não podemos desconsiderar que a harmonia do contôrno dos arcos
dentários, nas diferentes más oclusões, está alterada e isto ocorre por
responsabilidade da interação entre as forças naturais de equilíbrio
neuromuscular, o que desorganiza ou mantém a desorganização do sistema.
Aparelhos ortodônticos ou ortopédicos (fixos ou removíveis) criam forças
adicionais, que operam na direção da normalização do sistema estomatognático,
dependendo do processo de adpatação neuromuscular.
Como diz Fränkel6,
não há dúvida mais: os aparelhos não se constituem hoje um grande problema.
Um dos grandes problemas - que ainda não se conhece direito - é o que acontece
depois que os aparelhos são removidos e as forças adicionais às naturais
deixam de operar. As avaliações após o tratamento mostram que os resultados
morfológicos serão estáveis, somente se eles estiverem em equilíbrio com as
forças biomecânicas que estão agindo no sistema, isto é, se ocorrer a
readaptação neuromuscular.
Desta forma, talvez
se possa concluir que a técnica é meramente o meio de se atingir um objetivo
de tratamento, este sim, muito mais crítico, porque o resultado final de um
tratamento pode não ser o mais adequado, nem mesmo o mais estável.
CONCLUSÃO
O
debate histórico que levou muitos Ortodontistas e Ortopedistas Funcionais a
estabelecerem posições divergentes com relação à técnica de correção das
más oclusões, pode estar se diluindo no tempo. Isto pode estar acontecendo, em
função do maior conhecimento dos detalhes do próprio debate e, do enfoque
contemporâneo do tratamento das más oclusões. O profissional mais atualizado,
pode estar utilizando dispositivos advindos de diferentes técnicas, tendo no
aparelho híbrido ou, no uso dos ativadores combinados aos aparelhos fixos,
sinais de convergência entre os argumentos ortodôntico e ortopédico que
marcaram o grande debate.
ABSTRACT
This article is carring out the authors' view about the debate:
Orthodontics vs. Functional Orthopedics in
malocclusions' treatment. The main objective is to brings up an attempt
to the historical origin of the
debate and the match between the main arguments involved in both sides of the
question. The factors that can explain the duration of the debate is being
discussed. The advantages in combining both techniques is pointed out as the
contemporaneous trend in Orthodontics or Functional Orthopedics.
KEYWORDS:
Orthodontics;
Maxillary Functional Orthopedics
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Fax:016 - 2365266
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